A poliomielite é uma doença que provoca morte e sequelas graves no desenvolvimento motor das crianças. Apesar de não ter cura, a paralisia infantil, como também é conhecida, é perfeitamente prevenível por meio de vacinação e está próxima da erradicação em todo o mundo. No entanto, a baixa cobertura vacinal pode fazer ressurgir a patologia.
Essa preocupação foi demonstrada durante o encerramento do terceiro dia do Summit Saúde 2020, que abordou os caminhos para erradicação da poliomielite e foi patrocinado pela Sanofi Pasteur.
Mediado por Rita Lisauskas (blogueira do Estadão e colunista da Rádio Eldorado), participaram do debate o assessor científico Akira Homma, de Bio-Manguinhos/Fiocruz; o assessor de diretoria Leonardo Weissmann, da Sociedade Brasileira de Infectologia; e a médica Luiza Helena Falleiros Arlant, membro da Câmara Técnica de Polio do Programa Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde.
Perigo de retorno da poliomielite
“Conseguimos, com campanhas nacionais de imunização, eliminar a poliomielite. Há 30 anos que não temos nenhum caso de pólio selvagem”, comemorou Akira Homma. No entanto, o vírus continua endêmico em países asiáticos, como Afeganistão e Paquistão, e ainda circula no continente africano.
Dessa forma, apesar do controle da poliomielite no Brasil, ainda há risco dessa patologia reaparecer no País. Isso já aconteceu com o sarampo. O País conseguiu o certificado de erradicação do sarampo, mas a baixa adesão à imunização fez a patologia ressurgir com força em 2018, e o Brasil perdeu a certificação.
A Campanha Nacional de Multivacinação de 2020 tem registrado baixa cobertura vacinal para diversas doenças, inclusive a paralisia infantil. “Esperávamos uma cobertura de pelo menos 95% das crianças de até 5 anos, mas não atingimos até o presente momento nem 40% durante a campanha, o que é um número extremamente alarmante”, alertou Leonardo Weissmann.
A presença do vírus já foi detectada no esgoto das regiões de Campinas e em Santos. “Mas, como a nossa população tem uma imunidade bastante alta contra a poliomielite, não tivemos nenhum caso determinado pelo vírus selvagem”, afirmou Homma. De qualquer forma, a vigilância epidemiológica tem de ser constante para poder atuar fortemente quando identificar qualquer caso.
Importância da vacinação
A criança precisa seguir o calendário vacinal recomendado pelo Ministério da Saúde, recomendou Arlant. A infectologista pediátrica afirma que é muito comum os pais não levarem a carteira de vacinação quando vão ao ambulatório e dizerem que seus filhos estão com as vacinas em dia.
Entretanto, o profissional de saúde é o responsável por verificar o calendário completo de imunização. “Existem 30 vacinas circulando”, comentou Arlant. Dessa forma, a criança pode ter tomado certas vacinas, mas ainda faltam outras.
A garantia de imunização contra a poliomielite é realizada por meio de quatro doses no Brasil. As três primeiras utilizam o vírus inativado e são injetáveis. A última dose é aplicada via oral, por meio da gotinha, e é feita com o vírus atenuado, como uma forma de reforço.
Dificuldades para imunização
Os especialistas apontam a complexidade do calendário nacional de vacinação e o número de doses de cada imunização como obstáculos para garantir uma cobertura vacinal adequada no Brasil. Além disso, a desinformação é uma barreira a ser enfrentada.
“Se pararmos para pensar em termos de comunicação, quando a gente vê divulgação sobre vacinação na mídia de modo geral? Na época de campanha”, relatou Weissmann. No entanto, as fake news circulam o ano todo. Dessa forma, “a comunicação tem de ser contínua, mostrando que as vacinas são eficazes e protegem contra uma série de doenças e que elas não vão matar ou causar outras doenças”, ele defendeu.
A combinação de aplicação de diversas vacinas em uma única dose também pode colaborar para aumentar a imunização. No Brasil, já existem vacinas liberadas que combinam seis antígenos diferentes. “Os centros privados de vacinação já fazem vacina combinada e com isso você garante que a criança vá e você não perca a oportunidade de vacinação”, exemplificou Arlant.
As vacinas que são aplicadas atualmente, como a BCG, existem sem grandes melhorias há mais de 80 anos. Para Homman, no futuro, novas tecnologias permitirão que a imunização deixe de ser injetável, evitando causar dor: “A nova forma de administração é uma forma importante que estamos perseguindo, mas não sei quanto tempo vai demorar. Vai demorar, mas chega”.