Há algumas décadas, os anos 2000 eram vislumbrados como um paraíso com carros voadores, arranha-céus e uma infinidade de robôs. Já completamos quase 20 anos nesse “futuro” e muitas promessas ainda não foram cumpridas, mas a tão sonhada manipulação genética já saiu do papel.
Em 2012, a tecnologia CRISPR-Cas9 mostrou que era possível cortar a dupla hélice do genoma com uma precisão impressionante, abrindo espaço para manipulações e possíveis curas de doenças. A remontagem da sequência de genes, porém, continua sendo a parte mais difícil do processo, pois a célula pode agir por conta própria, inserindo dados antes de o DNA ser manipulado.
Cientistas da Universidade Harvard e do Instituto Broad, gerenciado pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), anunciaram o aperfeiçoamento da técnica, tornando sua eficácia muito maior e abrindo a possibilidade de cura para até 89% das doenças genéticas já conhecidas.
Como funciona a CRISPR Prime?
A primeira versão da edição do genoma utiliza a enzima Cas9, que, através de uma molécula guia de RNA, é capaz de encaminhar os cientistas até o DNA a ser modificado. Depois, basta remover as partes danificadas e introduzir sequências genômicas para obter o resultado desejado.
Acontece que, ao cortar a fita do DNA, a célula pode tentar se reparar sozinha, criando sequências não previstas pelos cientistas. Mesmo que isso não aconteça, a inserção de novos dados no genoma pode acabar gerando efeitos colaterais não previstos, criando mutações indesejadas caso sejam colocados em lugares errados. Além disso, certas introduções de bases de DNA não são indicadas na manipulação genética usando a primeira técnica CRISPR.
A versão Prime veio para corrigir essa deficiência e aprimorar a edição genética. Agora é possível modificar ou excluir letras individuais do DNA e inserir uma cadeia de várias letras com uma precisão muito maior do que antes. Trata-se de uma conquista imensa, pois abre portas para que condições genéticas graves e fatais, como a doença de Tay-Sachs, originada pela mutação de quatro letras do DNA, possam ser curadas através de uma manipulação.
Aplicações práticas
Um dos componentes do câncer de mama é genético: mulheres com histórico familiar têm mais probabilidade de desenvolvê-lo. Com a manipulação genética, é possível corrigir os genes defeituosos que podem desencadear esse tipo de câncer e vários outros em que a carga genética esteja diretamente envolvida.
Doenças como anemia falciforme, diabetes e fibrose cística podem acabar sendo extintas, no futuro, com a manipulação dos genes defeituosos que as originam. Até mesmo o Alzheimer poderia ser curado ou atenuado.
Outra vantagem seria de ordem econômica: os serviços de saúde ficariam menos sobrecarregados de pacientes que precisam de tratamentos para doenças genéticas. A população teria uma qualidade de vida muito maior e até mesmo a expectativa seria muito mais longeva.
As críticas relacionadas à manipulação genética, entretanto, são de ordem moral e ética: até que ponto os seres humanos a usarão apenas para corrigir defeitos? Ela não será usada para gerar bebês “perfeitos” tanto na saúde quanto na aparência física? Essas são questões que apenas o tempo poderá responder.
E para o futuro?
Ainda que a nova tecnologia seja bastante promissora, é preciso ter cautela sobre a sua aplicabilidade. A CRISPR Prime foi anunciada em outubro de 2019 e necessita de mais testes para que o seu verdadeiro potencial seja reconhecido. Até agora, algumas doenças já puderam ser corrigidas em laboratório, como a anemia falciforme.
Fontes: The Scientist, BBC, TechCrunch.