A pandemia do novo coronavírus, que começou em Wuhan, na China, já se espalhou por mais de 180 países. Desde que o vírus surgiu, cientistas do mundo inteiro estão se dedicando a buscar respostas, tratamentos e vacinas. Algumas das pesquisas realizadas são sobre a origem do Sars-Cov-2.
De acordo com um estudo publicado na revista Nature Medicine e assinado por pesquisadores de diversas universidades, o novo coronavírus é resultado de uma evolução natural, sem evidência de que tenha sido criado artificialmente. Por outro lado, o Nobel de Medicina Luc Montagnier afirma que o vírus surgiu de um laboratório de Wuhan.
Dados disponíveis sobre o genoma do vírus
O coronavírus é uma família de vírus que pode causar algumas doenças. Uma das mais conhecidas é a Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars), que também se originou na China, em 2003. Outro surto provocado pelo coronavírus começou em 2012 na Arábia Saudita e se chama Síndrome Respiratória do Oriente Médio (Mers).
Em 31 de dezembro de 2019, a China notificou a Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre um novo surto de coronavírus, posteriormente chamado de Sars-CoV-2. Logo no início da epidemia, os cientistas chineses sequenciaram o genoma do novo vírus e disponibilizaram os dados para o resto do mundo.
Essas informações permitiram que os pesquisadores descobrissem que a covid-19 era altamente transmissível entre seres humanos. Além disso, os dados foram usados para explorar a origem e a evolução do vírus.
Divergências entre pesquisas
Em entrevista para a Scripps Research, o pesquisador Kristian Andersen, PhD, afirma que ao comparar os dados do genoma do novo coronavírus para cepas já conhecidas é possível confirmar que o Sars-CoV-2 se originou de processos naturais.
No estudo divulgado na Nature Medicine, os cientistas se concentraram em analisar o modelo genético de proteínas spike, um tipo de armadura que fica fora do vírus e é usado para penetrar nas paredes externas das células humanas e animais.
A equipe focou principalmente no domínio de ligação ao receptor (RBD) e descobriu que a proteína spike Sars-CoV-2 é eficaz em se ligar às células humanas; ou seja, isso indicaria que o vírus só poderia ser resultado da seleção natural.
Essa conclusão foi confirmada também pelos dados da “espinha dorsal” do Sars-CoV-2, sua estrutura molecular geral. De acordo com o estudo dos cientistas, se alguém tivesse tentado criar um novo coronavírus, teria construído a partir da “espinha dorsal” de um vírus já conhecido. O que a equipe constatou foi que a “espinha dorsal” do Sars-CoV-2 é diferente das dos coronavírus conhecidos, se assemelhando principalmente às dos vírus encontrados em morcegos e pangolins.
Com base na análise da sequência do genoma do novo coronavírus, Andersen e seus colegas concluíram que o vírus teria duas origens possíveis.
No primeiro cenário, o vírus teria evoluído para o seu estado atual naturalmente em um hospedeiro animal e, depois, passado para os humanos. Os pesquisadores indicam que, no caso do Sars-CoV-2, o animal mais provável é o morcego. Porém, acreditam que não houve transmissão direta entre morcego e humano, mas sim que existiria um hospedeiro intermediário entre eles.
No segundo cenário, uma versão não patogênica do vírus teria saltado do animal para o homem e só então avançado para seu estado patogênico atual. Nesse caso, o local de clivagem poderia ter evoluído direto no hospedeiro humano. No artigo, os cientistas afirmam que o local de clivagem Sars-CoV-2 é semelhante aos de clivagem de cepas da gripe aviária, o que facilita a transmissão entre as pessoas.
Vírus criado em laboratório?
Em entrevista ao site francês Pourquoi doctor? (em tradução livre, Por que, doutor?), o Nobel de Medicina e professor Luc Montagnier declara que o novo coronavírus foi criado em Wuhan, e o laboratório da cidade se especializou nesse tipo de vírus desde o começo dos anos 2000.
Montagnier explica que ele e seu colega matemático, Jean-Claude Perrez, analisaram a sequência do genoma do Sars-Cov-2. O especialista afirma que eles não foram os primeiros a descobrir a origem laboratorial do vírus. A descoberta já teria sido feita por um grupo de cientistas indianos, que precisou se retratar após publicar um estudo afirmando que o novo coronavírus possui sequências do HIV, o vírus da AIDS.
Em sua entrevista, o professor afirma que, na tentativa de criar uma vacina para o HIV, a sequência desse vírus foi inserida no genoma do coronavírus, o que comprova sua origem artificial.
O especialista em virologia molecular Simon Wain Hobson afirmou em entrevista à RFI que a declaração de Luc Montaigner está errada. Segundo Hobson, o genoma do novo coronavírus é rico em duas bases do seu genoma, e o HIV é rico em uma delas. Ao olhar a sequência genética de ambos, pode-se entender que há similaridades. Contudo, eles não compararam o genoma do Sars-Cov-2 aos de outros genomas, como o humano, que também possuem partes dessa sequência.
Fonte: Scripps Research, Nature Medicine.