Covid-19: os riscos da interiorização da doença

7 de julho de 2020 5 mins. de leitura
Um a cada três casos de covid-19 pertence a municípios no interior do Brasil, e a falta de estrutura nessas regiões preocupa

Embora a pandemia de covid-19 tenha impactado primeiramente os grandes centros urbanos (e ainda os afeta de forma mais severa), a doença já está se alastrando para o interior do Brasil, o que preocupa as autoridades e os profissionais da Saúde dessas regiões.

Afinal, além dos riscos que surtos do novo coronavírus trazem para qualquer lugar, como a sobrecarga dos serviços de saúde, os municípios do interior possuem menos recursos do que as capitais para lidar com esse cenário.

Os especialistas se preocupam principalmente com a possibilidade de que o pico da covid-19 no interior do país aconteça durante o inverno. De maneira geral, essa é uma época em que os serviços de saúde já apresentam uma demanda maior, por conta de outras doenças respiratórias, como gripe, asma e pneumonia. Contribui negativamente para esse cenário o fato de que muitas cidades já relaxaram no isolamento social.

Aumento de casos no interior preocupa especialistas (Fonte: Pexels)
Aumento de casos no interior preocupa especialistas. (Fonte: Pexels)

O caso de São Paulo

Em São Paulo, por exemplo, cerca de 70% dos casos ainda se concentram na capital e em sua região metropolitana, embora 52,6% da população viva no interior. Porém, essa concentração era de 85% no início de maio, segundo reportagem do Estadão. De acordo com o boletim diário do Governo de São Paulo, dos 645 municípios do estado, cerca de 600 já registraram casos da covid-19 até 20 de junho.

O boletim mostra também que a ocupação de leitos no estado de São Paulo é de 65,9% para Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e 51,4% para enfermaria — índices que sobem para 69,3% e 58,3% na capital e em seu entorno. Contudo, é importante observar que a capacidade dos sistemas de saúde no interior é menor: das 5,6 mil vagas de UTI disponíveis em todo o estado, mais de 3 mil (em torno de 55%) estão na região metropolitana de São Paulo.

A situação tende a ser especialmente grave nos municípios menores, que dispõem de menos estrutura e precisam deslocar seus pacientes para centros regionais.

“Todas as cidades têm plano de contingenciamento, mas muitas delas não estão preparadas. Muitos municípios não têm um leito de UTI. Provavelmente, muitos não tenham nem leito de estabilização”, afirma Geraldo Reple, presidente do Conselho dos Secretários Municipais da Saúde de São Paulo em matéria do Estadão.

Interiorização preocupa em todo o Brasil

Um levantamento publicado no início de junho pelo Estadão mostra que de abril a maio, a covid-19 se interiorizou massivamente em todo o País. No início do período analisado, 12,4% dos casos da doença estavam nas cidades interioranas, mas esse índice saltou para 34,5%, em maio. Em meados de junho, cerca de 70% dos municípios com menos de 10 mil habitantes já haviam registrado casos da doença — parcela de 91% daqueles que apresentam entre 10 e 20 mil habitantes.

A reportagem também traz outra afirmação preocupante: na maioria dos estados brasileiros, a curva de casos no interior é muito mais ascendente do que nas capitais, crescendo em um ritmo quase duas vezes mais rápido.

O movimento de interiorização chama a atenção especialmente nos estados onde as capitais apresentaram um alto número de enfermos no início da pandemia, como São Paulo, Pernambuco e Amazonas. As cidades do interior apresentam um número maior de novos casos por dia do que as respectivas metrópoles, de acordo com números levantados pelo grupo Monitora Covid-19, da Fiocruz.

O problema da falta de estrutura

Assim como no caso de São Paulo, o movimento da covid-19 preocupa porque as cidades do interior possuem menos estrutura para atender pacientes. Segundo dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), embora as capitais tenham 24% da população, elas concentram 48% dos leitos de UTI.

O cenário pode ser ainda mais grave em regiões como o Centro-Oeste e o Norte, onde muitos municípios nem sequer têm médicos o suficiente e as distâncias entre as cidades são maiores. No Pará, por exemplo, há pacientes na Ilha de Marajó que precisam fretar aviões para chegar a Belém, como relatado em reportagem do Estadão. Em resposta, o governo estadual montou hospitais de campanha em cidades-polo no interior.

Municípios menores sofrem com a falta de infraestrutura de saúde (Fonte: Unsplash)
Municípios menores sofrem com a falta de infraestrutura. (Fonte: Unsplash)

Como explicou o virologista Pedro Vasconcelos em reportagem ao Estadão, esses fatores podem tanto gerar o colapso dos sistemas de saúde dos municípios do interior como também sobrecarregar os serviços dos grandes centros à medida que as pessoas se deslocam para esses locais em busca de tratamento. Esse percurso, por sua vez, pode gerar uma segunda onda da covid-19 nas capitais que inicialmente apresentaram menos casos.

“A saúde funciona em rede, não de forma isolada. Não é porque um município está com poucos casos que pode reabrir. Os pacientes das cidades menores vão procurar atendimento nas maiores”, afirma Diego Xavier, epidemiologista do Instituto de Comunicação e Informação em Saúde, da Fiocruz. “Ainda é só o começo e não sabemos aonde vai parar. O novo coronavírus demorou para chegar ao interior e as autoridades relaxaram. Agora a proliferação está muito acelerada”, ele complementa.

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Fontes: Governo de São Paulo e Estadão.

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