Com análises genéticas, é possível prevenir doenças e criar tratamentos específicos para cada paciente
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A medicina trabalha com evidências baseadas em estudos científicos e, dessa maneira, novos métodos de diagnóstico e tratamentos para os variados problemas de saúde são incorporados à literatura médica.
Com o desenvolvimento da medicina personalizada, entretanto, há uma mudança de paradigma: por meio de análise da genética do paciente, é possível identificar, prevenir e tratar doenças de acordo com as particularidades do organismo de cada um.
Com os avanços tecnológicos, a análise genética se tornou mais acessível e barata, sendo disponibilizada cada vez mais em laboratórios particulares, inclusive aqui no Brasil.
Embora ainda seja um processo custoso — portanto restrito a uma parte da população com boas condições financeiras —, a medicina personalizada é uma possibilidade real que traz um novo horizonte para diversas especialidades médicas.
Uma infinidade de doenças estão relacionadas a fatores como predisposição genética ou problemas cardíacos. Em vista disso, a medicina personalizada permite a realização de sequenciamento do genoma do paciente para descobrir qual a possibilidade que ele tem de desenvolver essas doenças. Assim, é possível ir muito além de uma análise de histórico familiar ou exames de rotina tomando ações reais de prevenção.
Um dos casos mais emblemáticos nesse assunto é o da atriz americana Angelina Jolie. Após um exame genético, ela descobriu uma mutação em um gene que lhe dava 85% de possibilidade de desenvolver um câncer de mama. Além disso, a mãe da atriz já havia morrido por conta dessa doença. Ainda sem ter qualquer célula maligna, ela realizou uma mastectomia dupla, diminuindo as chances de desenvolvimento de tumores para apenas 5%.
Muito além do exemplo da atriz, os exames genéticos permitem a descoberta do índice de risco de dezenas de doenças ligadas a fatores hereditários — como Parkinson, Alzheimer, diabetes, cardiopatias e tumores de diversos tipos. Dessa maneira, os médicos e pacientes podem agir de forma preventiva, antes do aparecimento de qualquer sintoma.
Tendo em vista os resultados clínicos do paciente, os médicos costumam testar os protocolos de tratamento mais conhecidos, adaptando-os ou buscando novas linhas, conforme a reação do organismo do paciente. Isso significa que a resposta costuma vir depois do início do tratamento.
Entretanto, com as análises genéticas, é possível ter essa resposta previamente: analisando como o organismo metabolizará cada medicamento, bem como os efeitos colaterais que ele pode desenvolver, o médico consegue escolher o protocolo mais eficiente logo no início do tratamento. Dessa maneira, é possível ganhar tempo, o que pode ser importante para a recuperação do paciente.
A realização de análises genéticas para testar a resposta a tratamentos recebe o nome de farmacogenética e já é realizada com centenas de medicamentos. Alguns, inclusive, recomendam essa abordagem já nas suas bulas. O método pode ser aplicado a medicações psiquiátricas, doenças cardíacas, antirretrovirais e vários outros tratamentos em que a efetividade pode depender de fatores genéticos.
Um exemplo clássico disso é a aplicação do Clopidogrel para impedir a formação de trombos em pessoas com doenças coronarianas. Como é explicado detalhadamente em um artigo publicado pelo Estadão, analisando os fatores genéticos ligados ao metabolismo da enzima CPY2C19, é possível saber de antemão se o uso do Clopidogrel será eficiente para aquele paciente ou se será necessário adotar outra linha de tratamento.
A medicina personalizada também traz perspectivas animadoras para os pacientes de câncer. É feito o sequenciamento do genoma do tumor com o objetivo de identificar a existência de um alvo nas células malignas, e com isso é desenvolvida uma terapia específica para matar essas células.
Um exemplo disso é a proteína R2, presente em células de alguns tipos de câncer de mama, como explica o oncologista Dr. Rafael Klakis, do Instituto Oncoguia, em entrevista para o canal da entidade no YouTube. Dessa maneira, o tratamento age especificamente nessa proteína, sendo muito mais preciso e eficaz, como também causando efeitos colaterais menos agressivos do que uma quimioterapia comum.
Um dos desafios para o desenvolvimento da medicina personalizada no Brasil é seu alto custo. Alguns laboratórios particulares já oferecem diversas opções de sequenciamento genético — tanto para estratégia preditiva como também para farmacogenética — ao custo de alguns milhares de reais.
Porém, em 2013, exames genéticos para 29 tipos de doença foram incluídos no rol de procedimentos que os planos de saúde devem oferecer, de acordo com determinação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Assim, eles se tornaram uma alternativa viável para os mais de 47 milhões de brasileiros que são beneficiários desse tipo de serviço.
Tornar esses procedimentos mais conhecidos e acessíveis é o grande desafio para o avanço da medicina personalizada no Brasil. Como afirmou Riad Younes, diretor do Centro de Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em entrevista para o Estadão, “A tecnologia nos mostra o medicamento certo para a pessoa certa, mas aplicar isso no Brasil ainda é um problemão. Os doentes não têm acesso e muitos médicos nem sabem que a tecnologia existe”.
Fontes: BBC, Estadão Saúde, Academia Nacional de Medicina, Instituto Oncoguia.