Bactérias resistentes: um desafio para a saúde mundial

1 de novembro de 2023 5 mins. de leitura
As bactérias resistentes sobrevivem e se multiplicam mesmo expostas a antibióticos; uma pesquisa recente utilizou inteligência artificial como mecanismo de direcionamento para o controle dessas superbactérias

As bactérias resistentes desenvolvem a capacidade de sobreviver e se multiplicar mesmo quando expostas a medicamentos antimicrobianos, como antibióticos. Igualmente conhecidas como superbactérias, apresentam uma resistência que é resultado de processos naturais de evolução e seleção, nos quais as bactérias mais suscetíveis são eliminadas, enquanto as resistentes sobrevivem e se reproduzem, transmitindo suas características para as gerações futuras.

O número de amostras de bactérias resistentes a antibióticos analisadas no Laboratório de Pesquisa em Infecção Hospitalar do Instituto Oswaldo Cruz aumentou de pouco mais de mil em 2019 para quase 2 mil em 2020 e ultrapassou 3,7 mil no período de janeiro a outubro de 2021, evidenciando um aumento na disseminação dessas superbactérias durante a pandemia de covid-19.

Como a resistência bacteriana pode surgir?

Alguns fatores favorecem o aparecimento de superbactérias, garantindo situações que geram a resistência bacteriana.

Mutação genética

As bactérias podem acumular mutações em seus genes ao longo do tempo, inclusive capazes de conferir resistência a antibióticos.

As mutações genéticas podem ser transferidas horizontalmente, pois bactérias trocam material genético diretamente entre si, permitindo a transferência de genes de resistência de uma espécie para outra.

Uso indiscriminado de antibióticos

O uso inadequado de antibióticos em humanos, animais e agricultura pode acelerar o desenvolvimento de resistência, visto que as bactérias são expostas constantemente aos medicamentos. O desafio no combate às bactérias resistentes está relacionado à diminuição das opções de tratamento eficaz. 

À medida que mais bactérias se tornam resistentes, a medicina e a ciência enfrentam dificuldades para encontrar medicamentos que possam combater as infecções de forma eficaz. Isso pode levar a infecções mais graves, complicações de saúde prolongadas e até mesmo morte. 

Além disso, a pesquisa e o desenvolvimento de novos antibióticos são caros e demorados, o que limita a disponibilidade de novas opções terapêuticas.

Medidas para evitar a propagação de resistência microbiana

Novas pesquisas indicam a importância de prevenir a infecção por bactérias multirresistentes, considerando a dificuldade de desenvolver novos antibióticos eficazes contra essas superbactérias. Algumas medidas preventivas são:

  • uso responsável de antibióticos: limitar o uso desnecessário de antibióticos em humanos e animais para reduzir a pressão seletiva que impulsiona o desenvolvimento da resistência;
  • higiene e prevenção: práticas de higiene rigorosas e medidas preventivas podem ajudar a reduzir a propagação de infecções bacterianas;
  • desenvolvimento de novos antibióticos: investir em pesquisa e desenvolvimento de novos medicamentos antimicrobianos para enfrentar as bactérias resistentes;
  • combinação de terapias: explorar o uso de combinações de diferentes antibióticos para superar a resistência.

Inteligência artificial como aliada no combate às superbactérias

Uma abordagem no combate à resistência bacteriana é reutilizar medicamentos existentes com perfis de segurança conhecidos. Nesse sentido, um artigo publicado em 2022 apresenta uma abordagem de aprendizado de máquina chamada InterPred que visa identificar o mecanismo de ação de antibióticos usando métodos interpretativos.

Determinar o mecanismo de ação desses medicamentos continua sendo um desafio e consome muito tempo
Determinar o mecanismo de ação desses medicamentos continua sendo um desafio e consome muito tempo. (Fonte: Getty Images/Reprodução)

O estudo, publicado na revista Scientific Reports, periódico da Nature, indica que o InterPred identifica com sucesso características importantes e as relaciona com mecanismos de ação dos antibióticos, fornecendo informações sobre possíveis candidatos a antibióticos com novos modos de ação.

A abordagem do InterPred contribui significativamente para o combate à resistência microbiana pela descoberta de:

  • novos mecanismos de ação, podendo levar ao desenvolvimento de tratamentos mais eficazes contra bactérias resistentes;
  • priorização de moléculas promissoras, pois permite a identificação de moléculas com compostos bioativos não documentados anteriormente que podem ter modos de ação únicos e desconhecidos, tornando-as candidatas promissoras para novos medicamentos.
  • otimização da utilização de recursos, considerando que os recursos para pesquisa e desenvolvimento de novos antibióticos são limitados, sendo então crucial o foco em compostos com maior potencial de sucesso.
  • prevenção da resistência futura, pois moléculas com mecanismos de ação inéditos têm menos probabilidade de encontrar patógenos já resistentes.
  • melhor compreensão dos mecanismos de ação, por entender quais partes das moléculas dos antibióticos interagem com os patógenos.

Essa abordagem tem o potencial de enriquecer a caixa de ferramentas terapêuticas contra infecções resistentes e, assim, ajudar a enfrentar esse desafio global de saúde.

Fontes:

ANVISA. Superbactérias: de onde vêm, como vivem e se reproduzem. Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa. 2018.

FIOCRUZ. Detecção de bactérias resistentes a antibióticos triplicou na pandemia. 2021.

Mongia, M., Guler, M. & Mohimani, H. An interpretable machine learning approach to identify mechanism of action of antibiotics. Sci Rep 12, 10342 (2022).

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