Dinamarca sacrifica visons para conter mutação de coronavírus

5 de dezembro de 2020 4 mins. de leitura
Segundo especialistas, ação foi necessária para preservar o desenvolvimento de vacinas contra cepas iniciais do Sars-CoV-2

A descoberta de cinco variantes do novo coronavírus levou a Dinamarca, um dos países europeus que obtiveram mais sucesso na contenção da covid-19, a tomar uma decisão drástica: abater cerca de 17 milhões de visons, criados para o fornecimento da matéria-prima utilizada na confecção de casacos de pele, e isolar 280 mil pessoas que residem nas áreas em que circulam as mutações.

Especialistas cogitam a possibilidade de os microrganismos terem atingido os animais a partir do contato com humanos infectados e se adaptado às condições para potencializar suas capacidades reprodutivas, ainda que não se saiba exatamente se esse foi o caso. De qualquer modo, depois de alterados, teriam voltado a infectar pessoas.

Desde o verão, autoridades tinham ciência da situação, e foram detectados, desde junho, 214 contágios relacionados na área da Jutlândia do Norte. O mais preocupante, entretanto, é que um caso estava na Zelândia, outra ilha do país, sugerindo que o vírus em questão começou a se espalhar.

Das variantes, a que recebe mais atenção é justamente a 5, uma vez que acumula quatro mutações na proteína S. Comparada às tradicionais, apresenta resistência maior a anticorpos humanos, o que pode comprometer pesquisas de vacinas em andamento, ainda que, por enquanto, não tenha dado indícios de perigos de maior poder de contágio ou de capacidade diferenciada de propagação.

“Não creio que uma cepa que se adapte ao vison represente maiores riscos a humanos. Não podemos descartar hipótese alguma, mas, a princípio, não deveria [representar]. Definitivamente, não haveria motivos para o aumento de transmissão. Não vejo razão alguma que justifique que o vírus seja mais severo”, disse Francois Balloux, diretor do Instituto de Genética da University College London, ao Stata News.

Visons teriam sido contaminados por seres humanos, o que deu origem a mutações do novo coronavírus. (Fonte: Shutterstock)
Visons teriam sido contaminados por seres humanos, o que deu origem a mutações do novo coronavírus. (Fonte: Shutterstock)

Comprometimento e cautela

Se não há perigo imediato à vista, o que explica a eliminação em massa de visons na Dinamarca? A princípio, não se sabe, já que os dados levantados por cientistas do Instituto Sorológico da Dinamarca não foram compartilhados em sua totalidade com a comunidade científica internacional. “Abater os animais pode evitar a disseminação das variantes e garantir a eficácia de uma vacina preparada contra a cepa inicial do vírus”, defende Jean-Luc Angot, inspetor-geral de saúde pública veterinária do Ministério da Agricultura da França.

Mette Frederiksen, primeira-ministra do país escandinavo, ressaltou o objetivo da ação em coletiva de imprensa: “Temos grande responsabilidade com nossa população. Com a mutação encontrada, o dever passou a ser maior e contemplar o mundo inteiro”. A Organização Mundial da Saúde (OMS) também se posicionou: “É normal que microrganismos do tipo sofram alterações com o tempo, por isso atuamos com redes de pesquisadores, incluindo virologistas evolucionários, times de sequenciamento e especialistas em biologia sintética para acompanhar essas mudanças”.

Mette Frederiksen, primeira-ministra da Dinamarca. (Fonte: Shutterstock)
Mette Frederiksen, primeira-ministra da Dinamarca. (Fonte: Shutterstock)

Um mal necessário?

Cientistas do mundo todo se colocam a favor da Dinamarca, ainda que façam ressalvas. Emma Hodcroft, virologista e pesquisadora de pós-doutorado na Universidade de Basileia, na Suíça, pediu no Twitter para as pessoas não entrarem em pânico, mas não deixou de criticar a falta de informações: “Se o país acredita que o caso é sério a ponto de eliminar sua população de visons, devemos concluir que é o suficiente para que esses dados sejam compartilhados o mais rápido possível, já que as variantes podem estar em outros lugares”.

Julián Villabona-Arenas, PhD em Microbiologia, vinculado ao Center for Mathematical Modeling of Infectious Diseases (CMMID) da London School of Hygiene and Tropical Medicine (LSHTM), ressaltou ao El Espectador que, mesmo que as possibilidades de perigos maiores sejam remotas, a situação deve ser analisada com cautela: “A decisão de sacrificar os animais se baseia no risco de que se tornem hospedeiros do Sars-CoV-2 a longo prazo e de que novas mutações apareçam e afetem negativamente a contenção do vírus. É melhor um passo muito grande no lugar de um curto demais”.

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Fonte: El Espectador, CNBC, Libération, NPR.

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