Evento discute desigualdade no acesso a tratamentos de câncer no SUS

19 de julho de 2023 6 mins. de leitura
Promovido pelo Estadão de forma online, o evento integra uma série de iniciativas do especial “Saúde Mais – Retratos do Câncer” e conta com o patrocínio do laboratório Novartis.

Demora na aprovação de tratamentos, proibição de prescrição por parte dos médicos e desigualdade entre sistemas público e privado são parte do retrato que constitui hoje o acesso aos tratamentos oncológicos no Brasil. Esses foram alguns dos pontos tratados no debate do evento os desafios de acesso aos tratamentos oncológicos no SUS da série Saúde Mais – Retratos do Câncer, promovido pelo Estadão com patrocínio da farmacêutica Novartis.

O evento foi transmitido pela internet em 19 de julho de 2023 e contou com a participação de dois especialistas sobre a importância do acesso aos sistemas de saúde ao redor do País. Também esclareceu como funciona o atendimento na rede pública e privada, diferenciando cada um deles, além de abordar a aprovação de novos tratamentos.

Aprovação de tratamentos e medicações ainda é lenta

Um entre os grandes desafios apontados pelos especialistas é a demora na aprovação de medicamentos de uso oral e endovenosa no Sistema Único de Saúde, processo feito tanto pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) quanto pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec). 

Já no que diz respeito ao sistema privado ou suplementar, é preciso, ainda, que tal medicação ou tratamento também esteja previsto no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

Porém, mesmo aprovado, não significa que o recurso estará disponível automaticamente aos pacientes. Rafael Kaliks, oncologista clínico do Hospital Israelita Albert Einstein, explicou que após a aprovação do registro pela Anvisa e caso haja recurso financeiro para arcar com os custos, geralmente altos, em 180 dias o paciente deveria ter acesso. 

A realidade, porém, é outra, e pode levar anos para quem depende da saúde pública. Já na rede privada, em certos casos o acesso é facilitado, mas não constitui regra. “Isso é uma tragédia porque o que importa é a saúde e o tratamento necessário. Em se tratando de câncer, prolonga-se a vida do paciente. Ou permite-se uma cura numa proporção maior. Qualquer atraso é excessivo”, destacou Kaliks.

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Desigualdade é realidade no acesso à saúde brasileira

Para Luciana Holtz, presidente e diretora executiva do Instituto Oncoguiao acesso à saúde é desigual no Brasil. “Vive-se uma prática onde a espera é menor para quem tem saúde suplementar. Outra coisa é o acesso. Ainda vivemos a angústia, já que pro paciente do SUS o medicamento não chega”, explicou Holtz.

Um fator de preocupação ressaltado por Luciana Holtz é o tempo, uma vez que faz diferença o medicamento certo chegar ao paciente no tempo adequado. Atualmente, existem diferentes tecnologias com recomendação positiva por parte da Conitec, mas que não chegam à população por falta de verbas para a realização da compra centralizada ou mediante Autorização de Procedimentos Ambulatoriais (Apac).

“Não basta a Anvisa dar o registro, é preciso saber se está disponível no SUS pelo reembolso do valor via Apac ou compra centralizada, uma ótima forma de disponibilizar medicamento pelo SUS”, lembrou Kaliks.

Entre os exemplos de tratamentos citados na ocasião está o relacionado ao câncer do tipo melanoma metastático via imunoterapia, que proporciona uma expectativa de cura ou de longevidade do paciente. A Conitec já recomendou positivamente a medida para o SUS, porém por um valor que não cobre o custo total. Já na saúde suplementar, segundo o oncologista, tal imunoterapia já é empregada, curando uma proporção de pacientes que não eram curados antes.

Desigualdade de atendimento e tratamento também acontece entre hospitais do SUS

Um estudo divulgado pelo Instituto Oncoguia em 2017 revelou que a falta de equidade na oferta de tratamentos ocorre, inclusive, entre hospitais do SUS. “Onde você mora garante um determinado tratamento que é diferente de outro local. O paciente convive com a desigualdade o tempo inteiro”, explicou Holtz.

A presidente do instituto explicou que no dia a dia do Oncoguia, espaço em que também se promove a educação dos pacientes, há uma grande desinformação, dificultando o acesso aos tratamentos adequados.

Médicos são orientados a não prescrever determinados tratamentos

Outro fator salientado pelos especialistas é que por vezes os médicos envolvidos conhecem os tratamentos e medicamentos mais eficazes, porém não são autorizados a informar ao paciente por pressões institucionais.

Os especialistas ressaltaram que, tal qual no SUS, as operadoras de saúde privadas também limitam a prescrição por parte dos profissionais, devido ao custo alto. “O profissional é proibido de prescrever tanto no privado quanto no SUS, quando o ponto central é o paciente receber o que precisa de melhor tratamento”, avaliou Kaliks.

Câncer de pele e de mama feminina estão entre as maiores ocorrências no Brasil. (Fonte: Getty Images/Reprodução)
Câncer de pele e de mama feminina estão entre as maiores ocorrências no Brasil. (Fonte: Getty Images/Reprodução)

Pandemia atrasou diagnósticos de câncer, hoje em estado avançado

Um outro estudo divulgado pelo Oncoguia, o Radar de câncer, detectou que atualmente mais de 60% dos casos de diferentes cânceres são descobertos em fases avançadas ou metastáticas, entre eles os de pulmão e de pâncreas. “Sabemos fazer diagnóstico precoce e não estamos fazendo. São gargalos sérios no Brasil”, apontou Holtz.

Outro exemplo citado é o de câncer de mama em mulheres. Recomenda-se no geral que aquelas acima dos 50 anos de idade façam a mamografia de rastreamento a cada dois anos. “Antes da pandemia, a aderência a regra era de menos de 25%. Hoje, caiu para 12%. Por aí dá para imaginar que metade das mulheres que teriam sido diagnosticadas com pequenos tumores hoje provavelmente têm tumores maiores, tanto em saúde pública quanto suplementar”, alertou o oncologista.

Casos de câncer devem aumentar até 2025 no Brasil

Um dado alarmante divulgado na ocasião é de que até 2025 devem surgir no País 705 mil novos casos de câncer por ano, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca). Isso se deve, entre outros fatores, pela prática de maus hábitos e pelo envelhecimento da população.

Entre as regiões mais afetadas estão a Sul e a Sudeste, nas quais estima-se uma concentração de 70% dos diagnósticos.

Um total de 21 tipos de câncer são os mais comuns de ocorrer, incluindo aqueles em órgãos como pâncreas e fígado. A maior parte dos casos está relacionada ao tumor maligno de pele não melanoma, aparecendo em 31,3% do total. Além deste, outros considerados mais comuns são: mama feminina (10,5%); cólon e reto (6,5%); estômago (3,1%); próstata (10,2%) e pulmão (4,6%).

Fonte: Estadão

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