Ritmo intenso, preconceito e assédio contribuem para as doenças mentais associadas ao trabalho
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Transtornos mentais como depressão e estresse estão entre as maiores causas de afastamento do trabalho no Brasil, revelando uma situação epidêmica. Foi o que concluíram os participantes da 342ª Reunião Ordinária da Comissão Intersetorial de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (CISTT) do Conselho Nacional de Saúde (CNS), ocorrida em maio.
Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), realizada em 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 10,2% das pessoas com 18 anos ou mais foram diagnosticadas com depressão naquele ano. Muitas vezes relacionado ao quadro depressivo, o suicídio ocasionado por adoecimento no trabalho também cresceu no período.
O sistema de informação de óbitos registrou 13 mil casos de suicídio no País no mesmo ano, dos quais cerca de 12 mil na população de 14 a 65 anos. Destes últimos, 10 mil tinham associação com pessoas em atividade de trabalho, a maioria (77%) entre homens.
Segundo a professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Márcia Bandini, que participou do evento, o sofrimento psíquico no ambiente de trabalho é um problema que precisa ser discutido amplamente, tendo em vista o cenário mostrado no levantamento.
Cobranças em excesso, metas inatingíveis, falta de reconhecimento e acúmulo de funções são alguns dos fatores que contribuem para o surgimento das doenças mentais. Nas pessoas que já tenham algum distúrbio previamente, esses aspectos facilitam a intensificação dos sintomas e o adoecimento.
Agricultores e trabalhadores de pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura são os mais afetados, conforme a PNS, seguidos por bombeiros, policiais e agentes carcerários. Profissionais da enfermagem, construção civil e transportes também aparecem em destaque no ranking.
Para Tânia Maria de Araújo, pesquisadora da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), os dados sugerem uma situação desanimadora, pois apontam tendência de crescimento. “Trata-se de uma situação que tem o desenho claramente definido de uma epidemia”, disse ela ao site do CNS.
A especialista da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) Thaís Oliveira acredita que a situação pode ser ainda pior, pois muitos trabalhadores não expõem suas dores. “Há medo e receio de culpabilização pelo sofrimento em termos individuais, e isso historicamente gera a invisibilidade da situação”, observou.
Diante do quadro grave de sofrimento psíquico no ambiente de trabalho, as especialistas sugerem a criação de políticas públicas que promovam a saúde mental nas empresas e no Sistema Único de Saúde (SUS). A formação de gestores com foco na saúde do trabalhador é outra medida importante.
Elas indicam ainda o resgate e o fortalecimento de coletivos e entidades de representação, bem como a criação de espaços de denúncia para casos de assédio moral, igualmente em crescimento. Combater a naturalização e a romantização do estresse é outra ação apontada.
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As doenças psíquicas do trabalho podem ser tratadas com psicoterapia, medicamentos, afastamento, mudanças de hábitos e postos, entre outras alternativas, dependendo do caso.